Acaba de suceder ao pai, Belmiro de Azevedo, na liderança da Sonae Capital e continua a crescer na hierarquia.
Muito próxima do patrão do grupo, tanto no feitio como no modo de trabalhar e gerir, Cláudia Azevedo não é amiga de gargalhadas e não suporta ouvir um ‘não’. Mas gosta de futebol e de jantar fora.
Belmiro de Azevedo teve sempre uma certeza, possivelmente entre muitas outras: para fazer crescer o grupo Sonae até aos patamares por si definidos, precisava de criar um forte espírito de grupo que, por um lado, sustentasse esse crescimento e, por outro, o subtraísse às investidas da mobilidade. Foi para isso que criou o perfil e os mandamentos do ‘Homem Sonae’. A acreditar nos diversos testemunhos recolhidos pelo Económico, a ‘criatura’ desabou-lhe em casa, com uma ligeira alteração – a do género: Cláudia Azevedo, que acaba de substituir o pai na liderança da Sonae Capital, demonstrou sempre uma total e absoluta determinação em estar disponível para o grupo que o pai refundou a partir de 1974.
Talvez seja uma característica de duplo sentido: essa disponibilidade aproxima-a do pai – que, numa entrevista recente, alegava que Cláudia era, dos três filhos, a que mais se parecia consigo no campo emocional e no feitio – e afasta-a dos dois irmãos (Cláudia tem 43 anos, Nuno 48 e Paulo 47), sobretudo do mais velho, cuja passagem na Sonae é de uma intermitência que, diz-se, desespera o pai. Mas também do presidente executivo do grupo, Paulo Azevedo, para quem a Sonae não era um dado adquirido.
Dentro da Sonae
Licenciada em Gestão pela Católica e com um MBA do Insead, Cláudia iniciou a jornada pessoal na Sonae pelos fundilhos do gabinete de ‘marketing’, onde tomou contacto, através do já extinto Banco Universo, com o negócio da banca – onde o pai nunca se deu bem. Mas cedo chegou à área da comunicação.
Bem antes do jornal ‘Público’, Cláudia teve um primeiro encontro com o sector na Rádio Nova (no princípio dos anos 90). Era ainda muito jovem e, talvez por isso, conta quem com ela privou na altura, a filha de Belmiro “pouco percebia daquilo e chegou a aconselhar vários projectos completamente irrealistas”. Por esses anos, Paulo andava mais preocupado com a ‘Amiga Olga’ (um dos sucessos da Douro, produtora de TV e vídeo que liderava, vendido para a TVI) e Nuno preferia estar consigo próprio.
Já desde essa altura “não fazia alarde com o nome”, garantem algumas fontes. Mas é difícil que o nome de família não acabe por pesar dentro de um grupo económico familiar, seja ele qual for. Manteve-se na área do marketing quando o projecto Universo foi parar aos activos do BPI – banco onde também chegaram a estar parqueadas acções do ‘Público’ -, desta vez no segmento das tecnologias de informação, a Optimus (1998).
A operadora chegou a parecer que ia sucumbir sob o peso da concorrência – apesar de ter dado sobeja nota de vida com a Oferta Pública de Aquisição à Portugal Telecom – mas os caminhos entretanto cruzados com a Zon prometem-lhe vida longa. Mais recentemente, Cláudia ganhou novas responsabilidades ao ser o elemento da família Azevedo escolhido para participar na administração da Zopt, a empresa constituída pela Sonaecom pela empresária Isabel dos Santos, filha do presidente de Angola, para controlar a Zon-Optimus.
Cláudia foi mais tarde chamada a desempenhar funções numa das áreas de negócio mais problemáticas do universo Sonae: o jornal ‘Público’. “Quando chegou, não percebia grande coisa, pouco tempo depois sabia tudo. Fez o trabalho de casa de tal maneira, que é difícil estar melhor preparado que ela”, diz quem sabe. Mais: a esta motivação interior, Cláudia acrescenta “uma inteligência muito aguda e uma capacidade muito acima da média de identificar problemas, que lhe permitem descobrir a solução quando um problema bloqueia uma reunião”, confidencia um elemento do jornal que não fazia parte de nenhuma das listas de dispensados, a última das quais de Outubro de 2012. “Mesmo nessas alturas, a Cláudia deu sempre a cara: era ela que liderava as reuniões com a hierarquia do jornal onde as piores notícias eram dadas. E nunca recusou ouvir as opiniões contrárias”.
Diz quem a conhece que Cláudia Azevedo lida mal com um ‘não’, mesmo que a seguir venham as explicações mais convictas e os sorrisos menos forçados. Quanto a sorrisos, é difícil arrancar-lhe um, e ainda está para entrar na Sonae o primeiro a “conseguir fazer-lhe soltar uma gargalhada larga e sonora”. Há pelo menos duas razões para tal dificuldade: primeira, “é muito tímida” e o ar normal e severo trava qualquer aproximação de risco; segunda, “em trabalho, está sempre focada, não dá espaço – nem ela parece precisar – de momentos de desanuviamento”. Quando algum colaborador falha em relação aos planos definidos, ‘o caldo está entornado’: “é muito exigente e quando há uma falha é muito dura. Nesse aspecto é exactamente igual ao pai”, conta quem já assistiu a episódios desses.
Herdeira (de um terço) da terceira maior fortuna do país – avaliada, de acordo com a revista americana ‘Forbes’, em 1,1 mil milhões de euros -, Cláudia Azevedo é uma gestora “focada no trabalho” e capaz de ser, ao mesmo tempo, “exigente e flexível, sensível e tenaz”. A descrição é de Bárbara Reis, directora do ‘Público’. Cláudia é visita assídua na redacção do jornal da Sonae (onde fala a algumas pessoas, mas não tem um relacionamento próximo com os jornalistas) e está presente em permanência na gestão do diário. “Reunimos com muita frequência para falar sobre a gestão do Público”, revela Bárbara Reis. “Está atenta ao que se passa à sua volta em Portugal e no mundo. Além disso projecta-nos sempre para o futuro e está em constante busca de soluções e ideias inovadoras”, reforça a directora escolhida pela família Azevedo para liderar a reestruturação do jornal fundado há 23 anos. Em busca de exemplos de inovação, Cláudia chegou mesmo a visitar as redacções de jornais internacionais. Apesar do envolvimento na gestão do jornal, Bárbara Reis sublinha que a executiva do grupo Sonae “consegue o delicado equilíbrio entre estar muito presente na discussão do futuro do ‘Público’ e o respeito pelas questões editoriais”.
Fora da Sonae
Cláudia Azevedo parece separar a faceta profissional da pessoal. Fora do grupo Sonae é frequentemente vista a correr ou a passear na Foz, onde mora, como sucede, aliás, com os seus dois irmãos. Nuno, contudo, é o único que prefere a noite para passear sozinho o seu Labrador preto Rua do Crasto abaixo, Rua do Crasto acima.
Casada com Miguel Barros e mãe de dois filhos pré-adolescentes, diz-se que é uma adepta ferrenha do FC Porto, não descartando qualquer possibilidade de ver a equipa a evoluir nos relvados internacionais.
A timidez, ou parte, desaparece quando sai com os amigos – uma roda que não tem nada a ver com a Sonae – normalmente para jantar e noite adjacente, muitas vezes continuada no ‘clubbing’ da Casa da Música, onde o irmão mais velho é administrador. Pode não ser o caso nestas noites de folga, mas a família está sempre por perto. Seja nas férias, seja nos fins-de-semana na quinta de Marco de Canaveses, onde Belmiro mandou construir três casas para os três filhos, adjacentes à rústica e modesta casa principal que era dos seus pais.
Quanto ao resto, silêncio total. Não é preciso esgaravatar muito para saber que livros lêem, que carros têm e de que filmes gostam qualquer dos dois irmãos. Já sobre Cláudia, as escusas foram irrevogáveis. Porquê? Das duas uma: ou é por ser “muito racional e pouco afectiva. O Paulo é o protótipo do homem mediterrânico e ela é o protótipo da mulher nórdica”, dizem. Ou então é por ter um ‘killer instinct’ em elevado grau. Como a segunda opinião é do próprio pai, a dúvida está desfeita.
Fonte: Económico