Empresas gregas, irlandesas e portuguesas estão a financiar-se com sucesso crescente e a ‘abrir portas’ para o regresso dos Estados aos mercados. Emissões de dívida de companhias da periferia europeia duplicaram até Maio.
Com os Estados ainda à espera de regressar em pleno aos mercados, são cada vez mais as empresas de países intervencionados pela troika na Zona Euro que estão a financiar-se com sucesso junto de investidores, ‘à boleia’ de uma maior estabilização dos mercados e de uma euforia com os activos dos países periféricos.
Nos últimos meses, petrolíferas e telecoms gregas, bancos irlandeses ou empresas de vários sectores em Portugal conseguiram financiamento depois de verem os mercados encerrarem devido à crise do euro e aos resgates da Comissão Europeia e Fundo Monetário Internacional.
A Grécia teve no mês passado o regresso aos mercados da petrolífera Hellenic Petroleum e da operadora de telecomunicações OTE. Na Irlanda, o Bank of Ireland emitiu com sucesso 500 milhões de euros. E em Portugal, EDP, Portucel e PT registaram forte procura nos seus pedidos de financiamento.
Entre Janeiro e Maio deste ano, as empresas europeias com um rating de nível especulativo, como é o caso das oriundas da periferia da Zona Euro, emitiram mais de 48 mil milhões de euros em dívida, o dobro do registado no mesmo período em 2012, segundo dados da Dealogic.
Apesar da maior crise financeira da história da UE e com metade dos membros da Zona Euro em recessão, as companhias europeias conseguiram no seu todo levantar 320 mil milhões de euros nos mercados nos primeiros cinco meses do ano, de acordo com a Standard & Poor’s. Este valor supera, por exemplo, o pedido pelas empresas norte-americanas no mesmo período (285 mil milhões de euros), que actuam numa economia que deverá crescer 2% este ano.
Risco e lucro
O regresso dos investidores às empresas dos países intervencionados pela troika deriva de dois factores, segundo os analistas contactados pelo SOL. Primeiro, pela acalmia nos mercados financeiros após a garantia dada pelo Banco Central Europeu, no Verão de 2012, de que o euro não iria acabar, tornando a aposta nos activos periféricos menos arriscada.
O segundo prende-se com as altas taxas de retorno que estes investimentos geram. AHellenic Petroleum, por exemplo, cativou os investidores com um juro de 8%. A PT apresentou uma taxa de 4,6%. Estes valores comparam com as recentes emissões de dívida da Apple e da Microsoft, com juros de 0,5% e 0,9%, respectivamente.
«Com uma diferença tão elevada nestes rendimentos, os investidores passaram a procurar activos com maior risco para apimentar as suas carteiras», diz ao SOL Filipe Garcia, da IMF – Informação deMercados Financeiros, lembrando que já em 2012 o mercado das obrigações high yeld (emissões feitas por instituições com rating baixo e que pagam um spread elevado) foi o que mais procura teve em todo o mundo.
De acordo com dados do Royal Bank of Scotland (RBS), este mercado da dívida high yeld disparou nos último anos, movimentando hoje mais de 250 mil milhões de euros, cinco vezes mais que em 2009.
Correria irracional
Mas se o entusiasmo dos investidores pelos activos periféricos no último ano tem permitido o regresso aos mercados de muitas empresas portuguesas, irlandesas e gregas, os analistas lembram que muitos estão apenas obcecados pelo rendimento e a esquecer factores fundamentais como a sustentabilidade ou saúde financeira da empresa. «Esse comportamento leva a que muitos investidores corram mais riscos do que originalmente queriam, levando a uma correria de activos que tenham algum tipo de yield, mesmo que irracional», adianta ao SOL Salvador Nobre da Veiga, da XTB. «Pode ter um desfecho amargo», acrescenta.
O RBS acredita que o mercado de dívida para os países periféricos da Europa vai continuar em alta pelo menos até ao final do ano, embora Filipe Garcia lembre que já há sinais de alguma desaceleração.
Esta ‘janela de oportunidade’ pode permitir às empresas anteciparem financiamento futuro e sobretudo alimentar a confiança dos investidores para suportar o regresso aos mercados dos Estados e de companhias mais pequenas, como as PME.
Irlanda e Portugal pretendem recuperar o financiamento pleno em 2014. Os analistas lembram que o sucesso das empresas não determina o sucesso dos respectivos países no regresso aos mercados, mas a recente aposta dos investidores nas companhias gregas ou portuguesas é encorajadora.
Fonte: Sol